quinta-feira, 23 de março de 2017

O dia em que podia morrer.

O dia em que podia morrer não começou de manhã,
Começou com o primeiro empurrão.
Aguentei-me, e quase quis morrer.
Levei mais, e quase quis morrer.
Levei tantos, que quase podia morrer.
Mas no dia, em que de todos os dias, podia morrer, foi quando de viva, parei de viver.
Foi quando de susto me assustei de viver.
Foi do devasso de perceber, da sede não permitir, da alma não sumir, da bruma não parar.
No dia em que podia morrer, caí da dor de existir, da dor de ser.
No dia em que podia morrer, não morri por fraqueza, delicadezas de um espírito fraco, tremores de nervos frágeis. Ah! A vida é nada.
Nada somos, a que aspiramos? Mais um suspiro? Contamo-los até ao último, e o último não chega a tempo. Nada vem a tempo, somos do tempo que nos faz, ele nunca se nos chega, nunca se nos apráz.

No dia em que podia morrer,
Tinha já muitos planos de saúde, muitos sonhos de inocência. Temos fé a mais, para o abismo em que vivemos. Alçamos o céu e não somos mais que a cinza de amanhã, que tarda, com o tempo.

No dia em que podia morrer,
Escrevi.
Escrevi outrora, por outrora e por hoje.
No dia em que podia morrer, matei de um trago a saúde, rasguei de um lance este texto,
E de escrever,
Podia morrer,
Mas não morri.

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