segunda-feira, 3 de abril de 2017

A saga da fé. (P)Arte III

Passa o dia e a noite,
E todas as noites, tu me rezas.
O trecho decorado, o mesmo de sempre, desde o início dos tempos,
O tempos dos demónios.
E fazes das palavras anciãs as tuas,
Rezas como se suplicasses por mais.
Rezas como se a salva que decoraste te salvasse de ti.
Rezas, e pedes.
Todas as noites, de joelhos,
Pedes a Deus sem dar nada em troca.
Recitas essa falsa devoção, com os olhos brilhantes de quem já viu maior,
Mas é baça e soturna a tua sina de salvador.
Que pecados esses com que lavas a venda?

Antes consumida em chamas.
Antes ferver, que falar por frenesim.

Eu sou o meu fado, e é do meu fado não pedir ao que não é.
É do meu fado dormir com os mesmos medos com que vivo, porque não há amparo.


Não há a ajuda divina a que te benzes, e não há a fé com que acreditas.
Antes arder no meu fado.
Eu sou o meu fado.

Antes arder em mim.
E ver, sem ser maior, que chego ao mais alto do que sou, que sendo baixo, é do meu fado, e sou eu, sozinha.

Vem ver amor, sai dessa tua sede,
Sangra-te se sentes que as tuas maleitas te fremem as entranhas,
Mas não rezes mais,
Vem comigo amor,
Vem cá fora.
Estás sozinho,
Estamos sozinhos.
Estamos. Todos.
Coletivamente e absolutamente,
Sozinhos.

Desde o início dos tempos,
O tempo dos demónios.
O tempo de todos os cegos.

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